terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Família e escola: novos papéis e novas responsabilidades para uma nova disciplina

Família e escola: novos papéis e novas responsabilidades para uma nova disciplina

A família contemporânea passa por uma profunda crise. Já não mais dá conta das responsabilidades que lhe são atribuídas pela sociedade. Os conflitos que se apresentam na atualidade, principalmente os do mercado de trabalho, como a escassez de emprego, diminuição do poder de compra do salário e a inserção da mulher neste mercado, levam, necessariamente, a uma revisão na sua forma de educar e de se estruturar.
Com essa nova contextualização, surge uma desestruturação na constituição dos laços e valores afetivos entre pais e filhos que, indubitavelmente, interferem na educação da criança e do adolescente, na sua inclusão na vida social e na convivência socioescolar.
Há uma intensa cobrança sobre a família no que diz respeito aos valores éticos e morais que devem ser desenvolvidos na criança. Como a ética e a moral não se constroem sem afeto e este, devido à crise sociofamiliar, encontra-se em desequilíbrio, distanciando o adulto de suas responsabilidades afetivo-relacionais para com a criança, as famílias ou transferem para outros a responsabilidade da educação, como avós, tios, parentes, creches e escolas, ou recorrem a uma culpabilidade destrutiva e maculadora da relação afetiva entre elas e a criança.
Desta forma, com a desestruturação dos elementos psico-socioafetivos, a criança não consegue reconhecer a sua capacidade de assimilação dos valores constitutivos da disciplina, visto ser esta construída na vida afetiva e coletiva, frustrando criança, família, escola e sociedade.  Todos tornam-se vítimas de uma problemática enraizada mais na dinâmica econômico-social, na luta constante por melhoria de vida e menos na capacidade individual e familiar de se educar para o amor, para o convívio social e para a cidadania.
A criança, por não responder às expectativas da família, de seu grupo social, e por não ter conseguido compartilhar a experiência de reconhecimento das regras norteadoras da convivência sociocultural, também não consegue visualizar as regras sociais como processo de inclusão e integração, passando a construir sua compreensão de mundo por si própria.
As regras sociais se constroem coletivamente, através das trocas de experiências e na busca de elementos positivos à manutenção da convivência. Entretanto, quando a criança tem acesso restrito a essas condições, quando não há subsídios e aparato social que alimente essa vontade de se integrar, ela individualiza-se, isola-se. Por não ter apreendido os valores sócio-integrativos, experimenta de forma conflituosa e desintegrada o seu relacionamento com o grupo social em que está inserida. O que costumeiramente se denomina de “indisciplina”, ou seja, o não reconhecimento das regras que induzem o indivíduo àquilo que o grupo social considera como melhor para sua convivência.
Se a família enfrenta situações extremamente instáveis quanto ao seu papel social, com a escola não é diferente, pois em função dessas profundas mudanças e indefinições da estrutura sociofamiliar, acaba a instituição escolar se envolvendo em papéis que, até bem pouco tempo, não lhe eram atribuídos. Hoje parte das responsabilidades formativas da criança deixou de ser exclusivamente da família. Á escola foi incorporado o papel de colaboradora no processo educativo, intelectual e afetivo da criança.
A família, por não mais se encontrar em condições de assumir integralmente seu atributo formativo, pouco a pouco, vai transferindo e partilhando com outros, particularmente com a escola, a tarefa de educar para a vida. Nessa situação, a escola adentra um processo complexo e confuso, pois o seu papel epistemológico fica fragilizado enquanto o psicoafetivo se potencializa.
A família, diante da volatilidade da modernidade (pós-modernidade), não tem encontrado um referencial estrutural satisfatório para apoiar-se e encontrar respostas para essa instabilidade e a escola, que talvez até pudesse desenvolver esse papel, não tem conseguindo dar conta das variadas demandas que têm se apresentado, o que tem enfraquecido sua principal responsabilidade: educar e formar.
Indiscutivelmente se faz  necessário que a escola inclua, cada vez mais, os pais em seus projetos pedagógicos, fundamentalmente no que se refere à formação para a cidadania. Os professores, coordenadores e outros profissionais da educação devem estar preparados para, além de educar para a ciência e para a cidadania, educar também nos aspectos elementares do afeto e das relações interpessoais.
Mas à família cabe a responsabilidade de, aceitando seu limite formativo, buscar na escola possibilidades de seu crescimento, de seus filhos e da sociedade. Há de haver uma maior integração entre escola e família. É necessário também que no epistemológico se inclua a discussão de questões sobre a estruturação familiar e seus novos modelos e que, para a família, a escola seja um local real de desenvolvimento, não só do saber formal, mas também dos aspectos morais e afetivos.
A família e a escola incorporam o inconsciente cultural da sociedade contemporânea. A construção do saber, desde os primeiros movimentos da criança até a sua entrada no mundo do trabalho, passa pela família e logo em seguida pela escola. Não se pode pensar uma formação integral se ambas não estiverem em real conexão, recorrendo-se sempre ao diálogo de seus conflitos e à constante discussão de seus papéis e seus compromissos. Uma sociedade justa somente se constrói quando as responsabilidades são partilhadas e os diálogos constantemente estabelecidos.


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