domingo, 11 de março de 2018

Considerações sobre o “Projeto para uma psicologia científica” de Sigmund Freud





 Walter Fajardo


    Freud parte da ideia de uma cadeia de neurônios. Imaginava também que, percorrendo esses neurônios, teria já dentro dele uma coisa chamada de quantum, um quantum de energia ou simplesmente “Q”. Não se sabe se seria uma carga elétrica ou outro tipo específico de energia.
Mas sabe-se que sua manifestação, ou produção, tem relação direta com os estímulos, ou seja, para Freud, os estímulos seriam prováveis produtores de “Q”. 
Os neurônios seriam os veículos condutores desse quantum , desse “Q”. Portanto, por eles passam esses quantuns. Processo pelo qual será denominado de catexia (concentração de todas as energias mentais sobre uma representação bem precisa, um conteúdo mnésico, uma seqüência de pensamentos ou encadeamento de atos; catexe, investimento. Huais, 2011). Também se usa o termo investimento.

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A árvore da vida (Mondrian)
Haveria, então, três tipos de neurônios:
Permeáveis – permitem a passagem dos quantuns, passam pelos neurônios. Freud determina que esse tipo de neurônio sejas responsável pela memória.
Impermeáveis – não permitem que os quantuns passem pelos neurônios. Impedem a passagem nos neurônios.
Perceptuais – os quantuns passam rápido. Não retêm nenhum tipo de informação. Ele existe para perceber aquilo que ocorre internamente ou externamente. Por exemplo: as informações do olho ao cérebro (internamente), as informações de fome ao cérebro (externamente).
    Outro aspecto apontado por Freud é o resultado do acumulo de “Q”. Esse acúmulo gerará desconforto, como por exemplo, a fome que conduz ao cérebro o desconforto da ausência do alimento. O cérebro ao acumular essa informação produzirá um sinal de alerta, no caso de crianças, normalmente, o choro. Ao ser lançado esse alerta, ser-lhe-á oferecido um seio que, pelo fornecimento do leite, dará à criança a satisfação do término daquele desconforto.
    Esse processo denomina-se de satisfação ou prazer, que no sentido psicanalítico, significa descarregar  a “Q” pela motilidade. Motilidade seria a capacidade autônoma do organismo em buscar recursos exteriores para diminuir o desprazer ou a insatisfação.
Mediante a repetição desse processo, o pensamento se fixa na imagem de que a resolução da fome se dará através do seio. Processo pelo qual se forma a “idéia” que volta para a memória. Desta forma, esse processo resultará na idéia de que a criança, ao sentir fome, chora, pois na sua idéia, com esse recurso, ser-lhe-á oferecido o seio. Nesse sentido, surge então a esperança de que o seio lhe resolverá o problema da insatisfação, a fome.
    A esperança forma-se no princípio do aparelho psíquico como fonte de resolução de problemas, no caso da criança, a fome. Processo então que, na sua inconclusão, gerará a idéia de desesperança. Logo que a fome se acumula, surge o pensar relacional entre fome e seio. A primeira via que o aparelho psíquico vai recorrer é essa imagem.
Os problemas começam a surgir quando essa vontade ou essa imagem não se concretiza na realização ou satisfação do objeto desejado, ou ainda quando, apesar desse acumulo de energia, o individuo não demonstra nenhum tipo de reação (não, chora não se movimenta).
    Essa imagem primária recebe o nome de alucinação. Na ausência do seio, ocorre uma frustração ( um desejo não realizado). Entretanto quando o desejo se concretiza numa “descarga motora”, ou seja, uma manifestação corporal concreta na realização do desejo, a sensação desenvolvida é de prazer.
    Muitos problemas físicos podem ser decorrentes da não descarga do acúmulo de uma determinada energia. Por não haver a descarga ( o prazer), essa energia acumulada vai desequilibrar outros pontos do organismo. De alguma forma, essa energia é extravasada. Ao que se passou a chamar de processo psicossomático.
    Todo processo que não vai para a motividade, ou seja, que se mantém dentro do indivíduo, denomina-se PROCESSO PRIMÁRIO. Quando passa para a motividade, denomina-se PROCESSO SECUNDÁRIO. A não realização do desejo (a não descarga) ou o medo do desejo não ser realizado pode gerar a ANSIEDADE.
Outro aspecto a ser abordado é em relação à “dor”. A dor se realiza quando a quantidade de energia que passa pelos neurônios excede à quantidade habitual. É quantidade de “Q” passando por uma via de neorônios.
Mulher Chorando, Cândido Portinari
    Dor e sofrimento se diferenciam. A dor é gerada pelo excesso de energia numa determinada via de neurônios, o sofrimento, por sua vez, relaciona-se com a não realização de um determinado desejo.
Daí poder ocorrer o que se denominou de “trauma”, ou seja, uma quantidade excessiva de energia que se fixa na memória. Numa linguagem mais específica, o trauma se dá pela hiperestesia (paroxismo – aumento agudo - da sensibilidade, tendente a transformar as sensações ordinárias em sensações dolorosas; acuidade anormal da sensibilidade a estímulos – Houaiss).
    Então, retornando à questão do desprazer e do prazer, surge a idéia de que ambos estão diretamente ligados à motividade. No primeiro, as vias que causam dor não são facilitadas, podendo fazer com despertem as “barreiras de contato”.
    Outro conceito freudiano é o “eu”, que se apresenta como o conjunto de neurônios investidos de um determinado momento. É uma instância que tem toda a visão do que acontece ao redor de si. É maior que o prazer. Possui sentimento e emoções. O “eu” se constitui de conteúdos se dando a cada segundo, a cada instante.
    Em seus estudos, Freud acrescentará terminologias que vão dar sentidos específicos ao variados processos neurológicos.  “Princípio de realidade”, por exemplo, é o processo que diz que não será em todo momento possível descarregar a energia acumulada. Já “Julgar” será a capacidade do indivíduo em distinguir se o mesmo se encontra numa realidade ou num delírio. A dificuldade nessa distinção poderá desencadear uma “neurose”. Termos que, apesar de ser anterior a Freud, terá como significado o resultado de um conflito entre aquilo que o indivíduo é de fato, com aquilo que ele desejaria prazerosamente ser.