Este blog trará sempre reflexões, pensamentos, artigos, resenhas e poemas de Walter Fajardo
quinta-feira, 23 de julho de 2015
sábado, 7 de março de 2015
A música de Shöemberg
Shöemberg, recapitulando estruturas dos últimos quartetos de Beethoven, amplia as possibilidades harmônicas de seu antecessor propondo complexidades e densidades jamais elaboradas.
O compositor nos coloca
diante de uma musica que, ao mesmo tempo em que recorre à racionalidade
estrutural da harmonia (um novo estilo, uma nova técnica), nos conduz a uma
densidade formal que, numa aparente dissolução de imagens, demonstra
consistência estrutural e coerência estética.
Adorno traça o seguinte
comentário da obra de Shöemberg:
“ Os acordes complexos
parecem ao ouvido ingênuo ‘falsos ou falhos’, como se fossem o produto de um
domínio ainda imperfeito da arte, do mesmo modo que o leigo acha que estão ‘mal
desenhados’ os trabalhos da pintura de vanguarda”
Vamos ouvir
um pouquinho: Verklarte Nacht (1899):
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015
Obesidade: da necessidade à compulsão - um olhar psicanalítico
Nas últimas
décadas, a obesidade tem sido um dos problemas de saúde que mais cresce no mundo.
Os elementos que conduzem a essa condição são multifatoriais, mas, os aspectos
mais apontados como determinante na maioria dos casos, é o ambiente e os hábitos
alimentares.
Quando
falamos de ambiente, referimo-nos às influências exteriores ao indivíduo que
estimulam esse hábito alimentar. Portanto, falamos de como o meio social,
cultural e familiar interferem na maneira como as pessoas se alimentam.
Ao se
tratar dos hábitos alimentares, estamos nos referindo à quantidade, à qualidade
e à frequência com que as pessoas comem ou fazem suas refeições. O que passa a ser uma
questão de cunho pessoal e individual, referindo-se à maneira como cada um lida com a sua alimentação.
Desde
a infância, vamos aprendendo os valores e as práticas sociais e culturais da
família, comunidade e sociedade em que estamos inseridos. Nessa vivência,
incluem-se também os costumes alimentares, os quais podem ser positivos ou negativos. Mas não podemos deixar de observar que, na atualidade, o mercado de alimentos e
a propaganda comercial apresentam produtos que, mesmo nem sempre sendo
saudáveis, são apresentados como provedores de sensação de felicidade e de
alegria, o que, normalmente, é irreal, fictício e enganoso.
Essas
situações exteriores podem ser mudadas e questionadas, porém levam muito tempo
para se alterarem. Necessitam de ações sociais, conscientização da sociedade e
de mudanças estruturais naquilo que se concebe como saudável, positivo e
satisfatório para toda a sociedade. Portanto são demandas de dimensões
coletivas e sociais, e de políticas em relação à saúde pública.
Aquilo
que se refere às conseqüências dos hábitos alimentares, à possibilidade de
mudanças e de como cada pessoa vivencia essas experiências são questões que
incidem em âmbitos individuais, implicam em mudanças de atitudes e comportamentos, que,
normalmente, demandam ações de curto-médio prazo ou até imediatas. Possui
ligação direta com a saúde mental e física da pessoa, seu bem estar e sua autoestima.
A psicanálise atua nessa dimensão. O corpo, para viver, precisa apenas do
necessário. Mas nós não somos só biológicos. Temos sentimentos, medo,
ansiedade e insegurança. Elementos que são partes de nossa estrutura mental, ou
seja, são de ordem psíquica e que determinam a maneira como lidamos com a
alimentação.
Diferente, portanto, dos animais, pois a alimentação humana tem caráter afetivo. Come-se por prazer, por
ansiedade, por alegria, por tristeza, por amor e, até mesmo, por ódio. Por isso, dependendo do que está envolvido
nesse processo, a pessoa pode comer muito além do necessário ou comer o mínimo,
podendo, nos casos mais extremos, a nem mesmo comer, ou comer e desfazer-se
do que comeu.
Assim
a comida insere-se numa dimensão afetiva. Constitui-se elemento de
preenchimento ou de esvaziamento de algo que não se dá apenas no corpo. É de
ordem psíquica, emocional. É uma ausência que se sente no corpo, mas não é no
corpo. É um vazio, uma angústia, um sentimento.
Como
não é possível compreender o significado desse vazio e porque ele é sentido, busca-se
fora de si coisas (alimentos) que possam provocar a sensação de preenchimento. Como
esse processo nem sempre é consciente, essa busca por satisfação pode se dar de
forma desproporcional. Ao sentir o vazio, ingerem-se alimentos, e, normalmente,
ingerem-se muito, em seguida sente-se culpado. A culpa realimenta o vazio, a
angústia e a ansiedade. Assim, entra-se num círculo vicioso que parece não ter
saída.
O que era necessidade transforma-se em compulsão. Comer passa a ser a única forma de satisfação e de alívio da ansiedade. Como o vazio é existencial e psíquico, por maior que seja a quantidade de comida, não haverá plenitude.
O que era necessidade transforma-se em compulsão. Comer passa a ser a única forma de satisfação e de alívio da ansiedade. Como o vazio é existencial e psíquico, por maior que seja a quantidade de comida, não haverá plenitude.
A
psicanálise segue na direção dessa angústia, desse vazio e dessa ansiedade.
Conhecer o que motivou esses sentimentos é o foco do processo analítico. A
psicanálise é a ciência do autoconhecimento e quando a pessoa vai se
autoconhecendo, passando a compreender seus mecanismos psíquicos e os elementos
que determinam seu comportamento compulsivo, a sua vida começa a ter um novo
sentido.
Quando
se atinge esse nível de consciência, o individuo passa a entender seus próprios
mecanismos psíquico-emocionais. Assim, mudar passa ser uma opção. O que
determinará esse processo de transformação será a vontade de ser aquilo que se
deseja ser. Será uma escolha.
terça-feira, 27 de janeiro de 2015
Família e escola: novos papéis e novas responsabilidades para uma nova disciplina
Família e escola: novos papéis e novas
responsabilidades para uma nova disciplina
A família contemporânea passa por
uma profunda crise. Já não mais dá conta das responsabilidades que lhe são
atribuídas pela sociedade. Os conflitos que se apresentam na atualidade,
principalmente os do mercado de trabalho, como a escassez de emprego,
diminuição do poder de compra do salário e a inserção da mulher neste mercado,
levam, necessariamente, a uma revisão na sua forma de educar e de se
estruturar.
Com essa nova contextualização,
surge uma desestruturação na constituição dos laços e valores afetivos entre
pais e filhos que, indubitavelmente, interferem na educação da criança e do
adolescente, na sua inclusão na vida social e na convivência socioescolar.
Há uma intensa cobrança sobre a
família no que diz respeito aos valores éticos e morais que devem ser
desenvolvidos na criança. Como a ética e a moral não se constroem sem afeto e
este, devido à crise sociofamiliar, encontra-se em desequilíbrio, distanciando
o adulto de suas responsabilidades afetivo-relacionais para com a criança, as
famílias ou transferem para outros a responsabilidade da educação, como avós,
tios, parentes, creches e escolas, ou recorrem a uma culpabilidade destrutiva e
maculadora da relação afetiva entre elas e a criança.
Desta forma, com a desestruturação
dos elementos psico-socioafetivos, a criança não consegue reconhecer a sua
capacidade de assimilação dos valores constitutivos da disciplina, visto ser
esta construída na vida afetiva e coletiva, frustrando criança, família, escola
e sociedade. Todos tornam-se vítimas de
uma problemática enraizada mais na dinâmica econômico-social, na luta constante
por melhoria de vida e menos na capacidade individual e familiar de se educar
para o amor, para o convívio social e para a cidadania.
A criança, por não responder às
expectativas da família, de seu grupo social, e por não ter conseguido
compartilhar a experiência de reconhecimento das regras norteadoras da
convivência sociocultural, também não consegue visualizar as regras sociais
como processo de inclusão e integração, passando a construir sua compreensão de
mundo por si própria.
As regras sociais se constroem coletivamente,
através das trocas de experiências e na busca de elementos positivos à
manutenção da convivência. Entretanto, quando a criança tem acesso restrito a
essas condições, quando não há subsídios e aparato social que alimente essa
vontade de se integrar, ela individualiza-se, isola-se. Por não ter apreendido
os valores sócio-integrativos, experimenta de forma conflituosa e desintegrada
o seu relacionamento com o grupo social em que está inserida. O que
costumeiramente se denomina de “indisciplina”, ou seja, o não reconhecimento das
regras que induzem o indivíduo àquilo que o grupo social considera como melhor
para sua convivência.
Se a família enfrenta situações
extremamente instáveis quanto ao seu papel social, com a escola não é
diferente, pois em função dessas profundas mudanças e indefinições da estrutura
sociofamiliar, acaba a instituição escolar se envolvendo em papéis que, até bem
pouco tempo, não lhe eram atribuídos. Hoje parte das responsabilidades
formativas da criança deixou de ser exclusivamente da família. Á escola foi
incorporado o papel de colaboradora no processo educativo, intelectual e
afetivo da criança.
A família, por não mais se
encontrar em condições de assumir integralmente seu atributo formativo, pouco a
pouco, vai transferindo e partilhando com outros, particularmente com a escola,
a tarefa de educar para a vida. Nessa situação, a escola adentra um processo
complexo e confuso, pois o seu papel epistemológico fica fragilizado enquanto o
psicoafetivo se potencializa.
A família, diante da volatilidade
da modernidade (pós-modernidade), não tem encontrado um referencial estrutural
satisfatório para apoiar-se e encontrar respostas para essa instabilidade e a
escola, que talvez até pudesse desenvolver esse papel, não tem conseguindo dar
conta das variadas demandas que têm se apresentado, o que tem enfraquecido sua
principal responsabilidade: educar e formar.
Indiscutivelmente se faz necessário que a escola inclua, cada vez
mais, os pais em seus projetos pedagógicos, fundamentalmente no que se refere à
formação para a cidadania. Os professores, coordenadores e outros profissionais
da educação devem estar preparados para, além de educar para a ciência e para a
cidadania, educar também nos aspectos elementares do afeto e das relações
interpessoais.
Mas à família cabe a
responsabilidade de, aceitando seu limite formativo, buscar na escola
possibilidades de seu crescimento, de seus filhos e da sociedade. Há de haver
uma maior integração entre escola e família. É necessário também que no
epistemológico se inclua a discussão de questões sobre a estruturação familiar
e seus novos modelos e que, para a família, a escola seja um local real de desenvolvimento,
não só do saber formal, mas também dos aspectos morais e afetivos.
A família e a escola incorporam o
inconsciente cultural da sociedade contemporânea. A construção do saber, desde
os primeiros movimentos da criança até a sua entrada no mundo do trabalho,
passa pela família e logo em seguida pela escola. Não se pode pensar uma
formação integral se ambas não estiverem em real conexão, recorrendo-se sempre
ao diálogo de seus conflitos e à constante discussão de seus papéis e seus
compromissos. Uma sociedade justa somente se constrói quando as
responsabilidades são partilhadas e os diálogos constantemente estabelecidos.
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