“...assim me
torno eu próprio a humanidade;
e se ela ao cabo perdida for, me perderei com ela.”
Goethe
O que macula a alma não é a dor
daquilo que não realizamos,
mas o desejo constante e
incontido que, do âmago,
transforma-se em febre e destrói
nossos sonhos.
O contato com a realidade de
coisas mutáveis e insustentáveis.
Frígidas lâminas nos tornam
frágeis
e decepam os mais puros desejos e
os mais primitivos suspiros.
Irreconhecíveis a nós mesmos!
Nos odiamos se os despertamos ou
paralisamos os atos públicos de condenação.
Todos possuem e compartilham
olhares comprometedores,
mas, passíveis ao cotidiano fosso
das cidades, ausentam-se,
ilham-se nas multidões frustradas
que se aderem a uma falsa sensação de comunidade universal.
Não sentem, nem vivem!
No temor latente da aglomeração
das tensões, preferem o plástico, o flexível.
Cegam-se!
Em mim toda dor e todo sofrimento
se intensificam.
Recolho-me ao que é nato e inato,
sem ser redentor,
sem ao menos almejar um possível
ato heróico.
Amo o mundo e os homens,
amo-os por mim e por eles.
Ainda que odiá-los seja uma
propriedade da minh’alma,
é meu desejo amá-los.
Carrego todos os sentimentos
e ouço suspiros temerosos de que
as sombras possam ser a eternidade de meus dias
e minhas noites uma escuridão, um
betume.
Isso o betume!
Quem sabe o betume do barro
preto...
que nos remete à leve sensação de
um retorno ontológico, um lócus,
à fonte emergente donde brotou o ánthropos.
Preservarei o que há de
primitivo, de elementar e de fecundo
para que do inescrutável, do
intangível e da culpabilidade irremediável, possa fluir,
como um regato intermitente,
a outra face,
o oculto,
o imperceptível,
aquilo que ainda não foi dito.
Curvo-me ao tempo...
Satisfaço-me em não recorrer aos
quantificáveis.
Este é o tempo do incalculável,
da não metrificação,
tempo dos fluídos
insolidificáveis.
Não há retorno, nem volta!
Ao olhar, cabe-lhe tudo, todos os
espaços.
Aos passos, serve-nos caminhar
adiante.
Recorro ao barro para compreender
o sentido das edificações
e aos oleiros para me impregnar
do deleitoso desejo de construir
No inescrutável tateio os eternos
limites do saber temporal.
No intangível assento-me na
possibilidade de uma atitude expansiva e abrangente,
ainda que se apresente como
paradoxal.
Na culpabilidade
irremediável,
encontro
a angustiante sensação de que algo já poderia ter sido feito
Seguir
é o que nos oportuniza. Este é o tempo!
Há uma
temeridade, uma nebulosidade que circunda nossos olhares.
A
mácula da alma tende a nos atrofiar, a ferir nossos ossos,
a nos
tornar pedintes e recorrentes de uma fé que mais purga que liberta.
Se ao
tempo sou súdito, rebelo-me contra a submissão de um homem por outro.
Há
multiplicidade, há compartimentalização, há códigos indecifráveis,
mentalidades
geneticamente cibernetizadas.
Mas há
olhares, há homens, mulheres, crianças que todos os dias saem pelas ruas,
cães
que vasculham os cantos das cidades,
as mãos
ainda se entrelaçam e os braços enamorados se envolvem nas noites de frio.
Há
almas maculadas, como a minha,
que se
entristecem em ver
tantos
vivos, quase mortos;
tantos
sorrisos, quase tristes;
tantos
sonhos, quase pesadelos.
Mas que
seguem adiante,
ora
cabisbaixo, ora numa alegria utópica e transbordante,
às
vezes infantil.
Mas que
prefere caminhar
ao invés
de sorrir os sorrisos tele-enviados pelas megas inteligências que querem
uma
impossível homogeneização.
Nisso
eles se fragilizam e nós nos fortalecemos.
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